Cultura ou Estupro? Uma em cada três mulheres sofre violência no Brasil. (Datafolha)
Resumo:
Afinal
a violência contra a mulher é uma questão de ‘cultura’ ou um
ato criminoso? Conceituar apenas como cultura absolve o agressor? O
que as vítimas sentem? O termo “cultura do estupro” vem sendo
usado com mais freqüência pelos movimentos feministas, e este
artigo aborda a origem desse termo, bem como as conseqüências que
um ato de violência gera na vitima, elencando atitudes que
demonstram uma cultura baseada na desigualdade de gênero, e ainda
sugere para o leitor uma série de atitudes que podemos ter para
combater esse tipo de cultura.
Palavras
chaves:
Cultura, estupro, gênero, violência
Fotografia: Rafael Carrilho
Introdução:
Representada
por uma crença que livra o autor do estupro e transforma a vítima
em réu de questionamentos sobre seu comportamento, o termo “cultura
do estupro” foi definido no início dos anos 70 nos Estados Unidos.
Segundo
o site da Marshall
University Women’s Center, é caracterizado por um
ambiente em que prevalece a violação, onde a violência sexual é
normalizada e desculpada na mídia e na cultura popular. Através do
uso da linguagem misógina (discurso de ódio, desprezo ou aversão à
mulher), da coisificação da figura feminina, do glamour da
violência sexual, e de uma sociedade que cultua o fetiche da
satisfação sexual a ponto de ignorar os direitos e a segurança das
mulheres. A maioria das mulheres e meninas limitam seu comportamento
por causa da violação, com medo da violência. Homens, em geral,
não. Assim caminha a dinâmica da violação, a cultura do estupro
se apresenta como um meio imposto, pelo qual toda a população
feminina é mantida em uma posição subordinada à população
masculina, embora muitos homens não estuprem e muitas mulheres nunca
sejam vítimas. No contexto, vale incluir o triste fato de que
meninas entre 7 e 12 anos sejam as maiores vítimas dessa cultura,
com traumas imensuráveis e amplas consequências para a existência.
As
possíveis
conseqüências para as vítimas da violência sexual são: Seqüelas
físicas (marcas, dores, DST), Dificuldades de ligação afetiva,
Dependência química, Auto-estima fragilizada, Auto-imagem
distorcida, Intenção de suicídio, Condutas agressivas, Doenças
psiquiátricas, Insônia ou sono perturbado e Sentimento de culpa,
medo, raiva, vergonha.
O
silêncio e a sentença social das vítimas como culpadas são alguns
dos trágicos desdobramentos deste
ciclo de medo, cujo legado: é uma cultura de violação
estabelecida. “A
droga é algo que tem mais valor que uma mulher. A droga você cuida,
se cai um restinho você vai lá e pega. A mulher não, é um lixo,
um trapo rasgado, totalmente sem valor, como se não tivesse
sentimento, totalmente impotente. Resumindo: é a coisa mais
desprezível.” (relato
de uma sobrevivente de violência sexual)
Desenvolvimento:
Em
maio de 2016, um crime grave choca o país. Na cidade do Rio de
Janeiro, uma menina de 16 anos sobrevive a um estupro coletivo. A
repercussão é grande, com o fato da crueldade dos autores da
violência filmarem as partes íntimas da vítima e fazerem sátiras
acerca da menina – que, segundo as investigações, foi
violentada
por 33 homens armados. Polêmicas foram alimentadas por conta de a
moça apresentar traços de uma vida promíscua, visual provocante,
uso de entorpecentes e, sobretudo, por não ter sido a autora da
denúncia. Pré-julgamentos a respeito da situação
multiplicaram-se, como se o crime não fosse de responsabilidade dos
acusados. "Foi
horrível [prestar depoimentos], porque eles me culparam por uma
coisa que eu não fiz. Ficaram perguntando por que eu estava lá, se
eu tinha envolvimento, se já tinha feito sexo grupal. O delegado
estava querendo me botar como culpada de todas as formas. Aí, eu
parei de responder às perguntas, porque eu não era obrigada”,
disse ela, em entrevista ao programa "Domingo Espetacular”, da
Record. A adolescente foi acolhida em um programa de proteção a
crianças e adolescentes ameaçados de morte. Ela e a família
deixaram a casa onde viviam na zona oeste da capital fluminense.
A
história da Paula (nome fictício) relata quão dolorida é a
tragetória de quem sofreu por tantos anos com estupros que foram
silenciados. “Primeiramente
eu acho que a opinião das pessoas por nós não vai mudar. Porque a
sociedade vê assim: primeiro vem o ladrão, em segundo lugar o
assassino e depois a prostituta, infelizmente. Eu nasci num lar no
começo até legal, daí meu pai começou a se envolver com
espiritismo e ficou ainda mais agressivo, começou a estuprar eu e
minha irmã mais velha. Depois caí na mão de um pedófilo mais
velho e
aos 14 anos casei com ele. Antes eu tava acostumada a ser tratada a
pontapés, surras e estupros, mas ele me dava presente, eu era
tratada como uma princesa. Vivi bastante tempo com ele, mas ele usava
e abusava de mim e só fui perceber isso depois que me tornei uma
mulher. Fui procurar emprego, mas não consegui porque tenho só até
a terceira série. Foi quando comecei a me prostituir, de lá até
então eu já passei treze anos trabalhando como prostituta. Essa
vida é tão obscura que hoje eu tenho depressão, bipolaridade, um
monte de problema aí. Perante a sociedade eu comecei a me excluir e
preferi me tornar invisível, porque não quero me tornar parte desse
mundo podre que a gente vive. O homem pra mim é uma figura horrível.
E a forma que eu vejo o sexo? Tem a visão que aprendi na igreja que
o sexo é pra ser bonito, prazeroso e cúmplice um do outro, mas eu
acho que é o mal do século. Tá levando a perder conceitos,
princípios, família. E mesmo eu tendo levado uma vida toda
promíscua, de fazer sete programas numa noite eu ainda acho um
absurdo você ver na esquina uma guriazinha de treze anos com a bunda
pra cima, rebolando, dançando aqueles funk, um absurdo.”
Segundo
o Datafolha (2016) 20,4
bilhões de mulheres sofreram assédio com palavras, 5,2 milhões
sofreram assédio com toque físico em locais públicos, 2,2 milhões
sofreram assédio sexual, 52% das mulheres se calam diante das
violências sofridas, 11% fazem a denúncia, 13% falam para a
família.
O Brasil é o 5º no ranking mundial em homicídios de mulheres: 4,8
em cada 100 mil mulheres. (OMS)
As
leis brasileiras afirmam que: “Ter
conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14
(catorze) anos com ou sem consentimento”
é considerado Estupro de vulnerável. E que o crime de violência
sexual contra maiores de 18 anos pode ocorrer por ‘contatos físicos
(carícias não desejadas, penetração oral, anal ou vaginal com
pênis ou objetos), masturbação forçada, dentre outros; e sem
contato físico como: exposição obrigatória de material
pornográfico, exibicionismo, uso de linguagem erotizada em situação
inadequada’.
São
exemplos de atitudes identificadas na cultura do estupro:
-
A culpa é da vítima – “ela pediu isso!”;
-
Banalização da prática sexual;
-
Humor sem escrúpulos;
-
Tolerância ao assédio sexual;
-
Preconceito contra uma vítima e suas atitudes;
-
A indústria cultural que lucra, utilizando-se da violência gratuita, de banalizações da sexualidade e de imagens femininas em músicas, publicidade, teledramaturgia e afins;
-
Afirmação da masculinidade como dominante e sexualmente predadora;
-
Feminilidade como submissa e sexualmente passiva de consumo;
-
Estímulo para que os homens sejam agressivos;
-
Erotização precoce de meninas para que sejam sensuais;
-
Mito de que meninas pedem para ser violadas;
-
Princípio equivocado de que o pai tem pleno direito sobre o corpo de seus filhos;
-
Duvidar do relato de uma vítima, especialmente quando é muito jovem, tardando a denúncia;
-
Ensinar as mulheres a evitarem o estupro, ao invés de ensinar os homens a não as violarem;
-
A menção de que apenas mulheres promíscuas são estupradas;
-
Crença de que homens não são estuprados ou que apenas os fracos sejam;
-
Justificar uma violação como iniciação sexual.
-
Abandone estereótipos que possam moldar suas ações e definir sua masculinidade ou feminilidade;
-
Envolva-se! Influencie e colabore para o fim da violência contra as mulheres e seja um agente da paz e respeito ao ser humano.
Segundo
o Datafolha (2016) cerca de 1,4 milhão de brasileiras foram
espancadas no ano de 2016 e 1% delas levou, no mínimo, um tiro. Para
mudar esse quadro, sugerimos 10 atitudes para combater a cultura do
estupro:
-
Evite o uso de falas que denigram a mulher;
-
Nunca atribua culpa à vítima;
-
Posicione-se diante de uma piada ofensiva ou de uma violação trivial;
-
Diante de um relato de violência, seja solidário;
-
Pense criticamente nas mensagens da mídia sobre mulheres, homens, relacionamentos e violência;
-
Seja respeitoso com o espaço físico dos outros, mesmo em situações casuais;
-
Estabeleça uma comunicação saudável com parceiros sexuais baseada em respeito mútuo e consentimento plenos;
-
Respeite o tempo que cada um leva para definir o momento e a forma de sua iniciação sexual;
-
Proteja os direitos dos menores de 14 anos diante de qualquer ato libidinoso, visto que é considerado estupro de vulnerável;
-
Se você tem filhos, ensine-os a respeitar seu próprio corpo e o corpo do outro.
Considerações
finais
AS
organizações internacionais de direitos humanos, acreditam que é
possível erradicar a violência através de atitudes consciente, por
isso, é necessário difundir esse tipo de informação nas varias
formas de mídia. Ainda é importante ressaltar também as formas de
proteção e denuncia de qualquer violência, seja ela verbal, moral,
psicológica, física ou sexual, através do Disque 180 (Central de
Atendimento à Mulher em Situação de Violência), do Disque 100
(Disque Direitos Humanos – visa atender especialmente as populações
consideradas de alta vulnerabilidade, como crianças e adolescentes,
pessoas idosas, pessoas com deficiência, LGBT, pessoas em situação
de rua, quilombolas, ciganos, índios e pessoas em privação de
liberdade). E também através do aplicativo “Proteja Brasil” –
é possível fazer denúncias direto pelo aplicativo, localizar os
órgãos de proteção nas principais capitais e ainda se informar
sobre as diferentes violações.
Referencias:
Abreu,
Cristiano Nabuco de – Manual
Clínico dos Transtornos do Controle dos Impulsos
/ Cristiano Nabuco de Abreu, Hermano Tavares, TakiAthanássiosCordás,
Organizadores – Porto Alegre : Artmed, 2008
Bacelar,
Jeferson Afonso – A
família da Prostituta
– São Paulo, SP, Editora AticaS.A.
Foucault,
Michel, 1977 – História
da Sexualidade I: A Vontade do Saber
– Edições GRAAL LTDA, Rio de Janeiro, RJ
Langberg,
Diane Mandt – No
Limiar da Esperança: Abrindo Portas para a cura de Vítimas de Abuso
Sexual.
(tradução Werner Fuchs) – Curitiba: Editora Evangélica
Esperança, 2003.
Langberg,
Diane Mandt – Abuso
Sexual, Aconselhando Vítimas.
(tradução Werner Fuchs) – Curitiba: Editora Evangélica
Esperança, 2002.
Ludovico,
Isabelle – O
Resgate do Feminino, A força da sensibilidade e ternura em homens e
mulheres
– São Paulo, Mundo Cristão, 2010
Martin,
Garry, 1941 – Modificação
de Comportamento: o que é e como fazer
/ Garry Martin, Joseph Pear; 8 ed. – São Paulo,SP : Roca, 2009
Sites:
Viviane
Vaz
Psicanalista, Missiologa, Escritora, graduanda em filosofia,
autora do Livro “Infância Amputada”
Coordenadora do Projeto NOVA
vivi.vaz@gmail.com
Psicanalista, Missiologa, Escritora, graduanda em filosofia,
autora do Livro “Infância Amputada”
Coordenadora do Projeto NOVA
vivi.vaz@gmail.com
Comentários
Postar um comentário